Ladislau: e os bancos sugam a riqueza do mundo
Em vídeo-palestra, autor de “A Era do Capital Improdutivo” expõe os mecanismos que permitem à oligarquia financeira produzir desigualdade máxima, devastar a natureza e inviabilizar a democracia
Vídeo: Ladislau Dowbor | Texto: Ricardo Machado, no site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU)
A estranheza do tempo presente é tão grande que vivemos a época em que é o rabo que balança o cachorro. Quer entender como isso funciona em termos sociais e econômicos? O professor Ladislau Dowbor explica: “O sistema financeiro é de mediação, não produz nada. Então as áreas produtivas se tornam o meio para os especuladores ganharem dinheiro. Por isso eu digo, que é o rabo que balança o cachorro”, brinca Dowbor, ao fazer uma alegoria para demonstrar a centralidade do poder financeiro.
O professor Ladislau Dowbor apresentou seu livro A era do capital improdutivo. A nova arquitetura do poder: dominação financeira, sequestro da democracia e destruição do planeta (São Paulo: Outras Palavras, Autonomia Literária e Fundação Perseu Abramo, 2017), na noite da quinta-feira (19) na Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no Instituto Humanitas Unisinos – IHU em Porto Alegre.
A intereferência do sistema financeiro nas relações sociais gera profundos desequilíbrios. “Na questão ambiental, estamos diante de um desastre porque não estamos acostumados a pensar em longo prazo. Nós temos uma tremendo gap entre nossas capacidades técnicas e nossas capacidades de governança”, pondera Dowbor. “No plano social é inadmissível que oito famílias tenham a metade de recursos financeiros do mundo, sendo que nenhuma delas produz nada, são todas donas de negócios intermediários”, complementa.
Crise civilizacional
A crise financeira mundial instaurada a partir de 2008, não é somente no campo da econômico, mas o reflexo de uma crise civilizacional mais ampla. “A desigualdade não é somente um problema ético, é um problema político. E como respondemos a essa questão? Construindo muros? Colocando barcos no mediterrâneo para as pessoas não chegarem à Europa?”, questiona.
“Nosso problema não é falta de recursos. É um problema de governança. O ser humano é insuperável na capacidade de construir computadores, mas ainda temos pobreza e fome. Inclusive os custos indiretos de não resolver a pobreza são muito maiores do que os necessários para combater essas mazelas”, provoca.
Para Dowbor, a questão de recursos financeiros não é um problema frente os desafios atuais, porque há dividendos financeiros, o único ponto é destiná-los para reduzir o impacto ambiental e social. “A partir de 2008 não mudou nada em termos de estrutura, mas começamos a entender algumas coisas. Stiglitz é um dos que têm estudado os efeitos do desajuste financeiro, onde o capital improdutivo rende mais que o produtivo”, exemplifica.
Estamos, segundo o professor, diante de uma nova ordem de influência das corporações na política, em que elas incidem diretamente nos políticos por lobbies peer-to-peer, entre empresários e ocupantes de cargos eletivos. É esse fenômeno que Stiglitz analisa nos EUA, mas que ocorre de maneira similar no Brasil. “O sistema financeiro está comprando universidades pelo mundo todo, sem falar no Brasil. Há revistas acadêmicas compradas com dinheiro desses grupos. Há compra da mídia do modo clássico e as invasões de privacidade no nível das mídias digitais. Hoje em dia, laboratórios vendem informações de pacientes para seguradoras. As transformações nos regimes de poder são absolutamente radicais”, destaca o conferencista.
O fim do capitalismo democrático
Para o professor, o capitalismo tardio não está perto de fim; o que mostra sinais de esgotamento frente o avanço dos processos de financeirização é o capitalismo democrático. “Não é o fim do capitalismo, mas o fim do capitalismo democrático. Antes eles precisavam de milhares de pessoas, hoje a regra mudou e são as próprias corporações quem decidem o que pode e o que não. Isso porque o sistema financeiro é global e o controle dos bancos centrais são nacionais”, frisa.
Ao refletir sobre os quatro motores que colocam em marcha a economia, Dowbor demonstra porque nossa engrenagem social emperrou. “O primeiro motor é o da exportação, mas é muito instável porque não controlamos os preços e dependemos do mercado externo. O segundo motor, é o consumo das famílias, que com o desemprego e a instabilidade econômica está travado. Quebrando o segundo motor, que são as famílias, o terceiro, o do mercado produtivo, entra em colapso porque não tem consumo e o juro é muito alto. O quarto motor, o investimento estatal, que deveria ser utilizado para o investimento em estruturas, é usado para o pagamento de juros da dívida para bancos”, pontua Dowbor.
Além disso, o professor lembrou que os juros no Brasil são pornográficos, fruto de agiotagem pura. “Há um mecanismo muito simples, mas eficaz, de desvio dos recursos públicos para os bancos. Isso drena a capacidade financeira do estado. O sistema tributário não corrige, agrava o problema. Ainda tem todo o valor que vai para paraísos fiscais. Esses especuladores não só não investem, como deixam o dinheiro parasitar”, critica.
Por fim, para fugir de um binarismo que em nada contribui com o debate, Dowbor descarta qualquer possibilidade de um debate radicalizado e polarizado. “Nós somos muito grandes e complexos para ficarmos num esquemão ideológico estatal ou privado. Precisamos pensar de maneira diversificada”, sugere e finaliza.