Reforma da Previdência envolta em injustiças e desinformação
Alegando um déficit contestado por entidades e especialistas, governo Temer segue empenhado em dificultar direito a aposentadoria ao mesmo tempo em que deixa de cobrar de empresas dívidas e impostos que financiam o INSS
Segundo a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a dívida das empresas com a Previdência atingiu R$ 426 bilhões em 2016 e equivale a quase três vezes o alegado déficit da Previdência no mesmo ano (calculado pelo governo em R$ 151,9 bilhões). E essa dívida é de apenas 3% das empresas no país. Entre as devedoras estão Bradesco, Caixa, Itaú, JBS (dona de marcas como Friboi e Swift) e Vale.
Malabarismo – O famigerado “rombo da Previdência” é um dos principais argumentos do esforço de convencimento do governo para que a população aceite as mudanças nas aposentadorias. De acordo com a Previdência, em 2016 o déficit atingiu R$ 151,9 bilhões.
O valor é contestado por especialistas e entidades. Isso porque o governo calcula o déficit levando em conta apenas as contribuições das empresas e dos trabalhadores.
Mas de acordo com a Constituição Federal, a Previdência Social está inserida no sistema de Seguridade Social, que abrange também Assistencial Social e Saúde.
Esse sistema como um todo conta com diversas fontes de financiamento previstas no artigo 195 da Constituição Federal: Cofins, CSLL e Pis/Pasep, além das contribuições das empresas e dos trabalhadores.
Além disso, desde os anos 90 o governo desvia receitas que deveriam ser destinadas à Seguridade Social para o pagamento da dívida pública por meio de mecanismos como a Desvinculação de Receitas da União (DRU).
De acordo com Anfip (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal), foi subtraída uma média de R$ 52,3 bilhões por ano do sistema de seguridade social, por causa das DRU, entre 2005 e 2016. O país já pagou quase R$ 380 bilhões com os juros da dívida pública somente em 2017.
Ainda segundo a Anfip, se forem levados em conta todas as fontes de financiamento do sistema de Seguridade Social, o déficit apresentado em 2016 foi menor: R$ 56 bilhões em 2016 após anos operando com superávit.
“Esse resultado fiscal [deficitário] foi construído em cima de muita desoneração tributária, de reformas sociais que desempregaram as pessoas, rebaixaram salários, e retiraram direitos em favorecimento de grandes corporações financeiras e produtivas”, afirma Denise Lobato Gentil, professora de economia da UFRJ e uma das principais especialistas no sistema previdenciário.
Renúncias fiscais – De acordo com a Receita Federal, o valor das renúncias fiscais (desobrigação das empresas pagarem impostos como os que financiam a Seguridade Social) totalizou R$ 270,9 bilhões, em 2016, e chegará a 275,9 bilhões, em 2017.
Um dos exemplos mais recentes dessas renúncias se deu em 29 de novembro, quando a Câmara dos Deputados aprovou, por 208 votos a 184, a Medida Provisória (MP 795/2017), editada pelo governo Temer, que concede benefícios fiscais a empresas petrolíferas que atuarão em blocos das camadas pré-sal e pós-sal. A MP foi apelidada pela oposição de “MP do Trilhão” – por supostamente impor perdas da ordem de R$ 1 trilhão à União nos próximos 25 anos, em decorrência da isenção fiscal.
Segundo levantamento Aspectos Fiscais da Seguridade Social no Brasil, divulgado pelo Ministério da Fazenda, o déficit da Previdência Social seria 40% menor sem as renúncias fiscais.
“É preciso enfrentar a redução dessas desonerações tributárias, o que significa enfrentar grandes blocos de poder que estão instalados no Congresso Nacional. Temos de recuperar as receitas do sistema de Seguridade Social que foram totalmente destinadas ao aumento da margem de lucro dessas empresas”, defende Denise, acrescentando que um em cada sete congressistas são donos de empresas que devem ao sistema de seguridade social.
Quem ganha – Os recursos das DRU são drenados diretamente do bolso da população, na forma de impostos, para os detentores dos títulos da dívida pública. E os bancos recebem a maior parte dos juros dessa dívida, assim como são interessados diretos na falência da Previdência Social, para dar espaço aos planos de previdência privada, ofertados por essas instituições.
Para se ter uma ideia de como os bancos já estão lucrando com a mera possibilidade de a reforma da Previdência se concretizar, as contribuições a planos de previdência privada registram R$ 9,58 bilhões em setembro, crescimento de 28,94% frente ao mesmo mês em 2016, quando os aportes totalizaram R$ 7,43 bilhões. E esse aumento se deu em um ano de baixo crescimento econômico e desemprego alto. O dado é da FenaPrevi (Federação Nacional de Previdência Privada e Vida).
Fonte: Contraf-CUT