À espera da reforma da Previdência, governo vê revisão negativa no PIB e desemprego nas alturas
Se o governo Bolsonaro esperava que só a presença do economista Paulo Guedes no Ministério da Economia fosse suficiente para gerar uma expectativa positiva que implicaria aumento de investimentos no Brasil, os resultados da economia nos seis primeiros meses de comando do capitão reformado são um balde de água fria. A avaliação é do economista e professor da FGV Mauro Rochlin e ajuda explicar os números ruins de emprego e confiança dos consumidores de janeiro a junho deste ano.
Na posse, Bolsonaro afirmou: “Na economia traremos a marca da confiança, do interesse nacional, do livre mercado e da eficiência. (…) Realizaremos reformas estruturantes, que serão essenciais para a saúde financeira e sustentabilidade das contas públicas, transformando o cenário econômico e abrindo novas oportunidades”.
Seis meses depois, com o carro-chefe do governo, que é a reforma da Previdência, com uma tramitação conturbada no Congresso, os principais indicadores econômicos patinam. Em maio, o PIB (Produto Interno Bruto) registrou pela primeira vez uma queda trimestral desde 2016. Caiu 0,2% de janeiro a março.
Além disso, a previsão do crescimento do PIB caiu mais de 15 vezes neste semestre, segundo o Banco Central. A expectativa de alta foi de 2,6% no início do ano para 0,8%, segundo projeção divulgada no último dia 27.
O brasileiro sente o reflexo imediato dos dados negativos no dia a dia. Pela segunda vez consecutiva caiu a confiança do consumidor. Dados da CNI (Confederação Nacional da Indústria) mostram que o índice de 47 pontos, apesar de acima da média histórica (46,1 pontos), reflete a piora da expectativa em relação a emprego e endividamento das famílias. Toda vez que esse indicador está abaixo dos 50 pontos, significa que os brasileiros estão sem confiança.
A CNI também detectou que o brasileiro está mais desanimado sobre a possibilidade de retomada do emprego. Embora em maio o número de trabalhadores com carteira assinada teve tido a primeira alta depois de 4 anos de queda, o índice de desemprego ainda é bastante elevado.
O Brasil tem 13,2 milhões de desempregados, de acordo com dados do fim de maio. Na comparação com o trimestre anterior, houve um aumento no índice de 4,4%, pois eram 12,6 milhões de desempregados.
A culpa pela economia ruim é de quem?
Com seis meses de governo, dá para dizer que a responsabilidade pelos indicadores ruins é de Bolsonaro? Para Rochlin, não se pode dizer que o que está acontecendo na economia hoje — um crescimento pífio — é responsabilidade apenas de Bolsonaro. “Mas também não podemos dizer que o governo não tem nada a ver com isso que está aí, afinal já se passaram 6 meses.”
No entendimento do economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, é possível dizer que há um resultado positivo, reflexo da administração de Bolsonaro na economia. Um exemplo é o emprego, que embora ostente dados negativos, registrou alta na carteira assinada.
A expectativa dos especialistas é que os índices só melhorem quando o investimento voltar. A equação, no entanto, não é simples. Uma das variantes que mais tem dado trabalho ao governo é a política, especialmente na condução de reformas estruturantes.
“O investidor ainda está um tanto reticente. Primeiro porque ele quer ver a reforma da Previdência acontecer, segundo porque, no meu ponto de vista, o próprio governo Bolsonaro, até mesmo pelas suas atitudes, não inspira a maior das confianças. O que gera uma expectativa positiva é a presença do Paulo Guedes, não é o mandato do Bolsonaro”, diz Rochlin.
Vieira argumenta que a constante revisão do crescimento do País é um exemplo do tanto que a política interfere na economia. “A questão política gera uma influência grande na questão de investimento. De certa maneira, é como um fator que trava a questão econômica.” Para ele, a interferência foi maior no primeiro trimestre. “No segundo, os indicadores já começaram a dar um leve sinal de recuperação”, diz.
Foram nos primeiros meses do ano que houve maior rixa entre o governo, incluindo o presidente, sua equipe econômica e ideológica, e o Parlamento. Ainda que não haja consenso até hoje em relação à reforma entre o governo e sua base, há o compromisso de levar a proposta adiante.
Vieira acredita que se a reforma sair, vai ocorrer uma nova revisão do crescimento do País, desta vez para cima. ”É de considerar que há um aspecto político na expectativa.”
Reforma da Previdência
É praticamente unânime o argumento de que só com a reforma da Previdência será possível fazer uma melhor projeção para a economia do País. “Todas as demais medidas ainda estão na dependência da reforma da Previdência. Essa é a reforma-mãe de todas as reformas e, como ela não aconteceu, ainda está em processo de tramitação no Congresso, ainda não gerou efeitos”, diz Rochlin.
Para ele, estão em aberto pontos cruciais para entender a profundidade da proposta. “A gente ouve falar que estados e municípios estarão incluídos na reforma, depois que não estarão, a gente ouve que certas categorias vão ter condições especiais, depois ouve que não vão ter. São questões ainda relevantes porque vão definir como a reforma vai acontecer”, explica.
Análise do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) vai na mesma direção; para o instituto, a reforma é fator determinante para a sustentabilidade da política fiscal nos próximos anos.
“A comparação das estimativas entre os impactos da proposta de reforma do Executivo e aquela sugerida pelo relator da Comissão Especial mostra que em ambas mantém-se um espaço fiscal razoável para a realização das despesas discricionárias necessárias ao funcionamento do governo. No entanto, a recuperação do investimento público, atualmente muito comprimido, exigirá medidas adicionais visando à redução do crescimento das despesas obrigatórias”, diz documento do Ipea.
A previsão é que o relatório da reforma da Previdência seja votado nesta semana pela comissão especial da Câmara dos Deputados.
Passos para frente
O governo, entretanto, teve alguns ganhos na política econômica neste início de governo. Um deles foi conseguir dos Estados Unidos o apoio ao ingresso do Brasil na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). De acordo com o especialista da FGV em Relações Internacionais Matias Spektor, fazer parte do seleto grupo de países que integram a OCDE significa que o país respeita “boas práticas” de nações interessadas em abrir a economia.
KEVIN LAMARQUE / REUTERS
Em maio, Bolsonaro conseguiu apoio de Donald Trump para ingresso do Brasil na OCDE.
A bandeira está em convergência com a política econômica atual dirigida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Aos investidores, segundo ele, isso significa que o Brasil está comprometido com a saúde de sua economia a médio prazo.
Também conta positivamente para o País o acordo de livre comércio fechado entre o Mercosul e a União Europeia. Segundo o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, é um acordo importante, que ainda precisa ser ratificado pelo Congresso e pelos países signatários.
Fonte: HUFFPOST