Covid-19 chega às aldeias de Porto Alegre e põe indígenas em alerta
Um homem da etnia kaingang foi o primeiro indígena da região de Porto Alegre a se contaminar com o novo coronavírus. O contágio, tudo indica, aconteceu na serra gaúcha, durante a colheita do alho, um trabalho que os indígenas do Estado costumam fazer. Logo que começou a ter os primeiros sintomas da doença, o homem retornou à sua aldeia, procurou o sistema de saúde e testou positivo, no último dia 16. Porto Alegre tem 10 aldeias indígenas de três etnias – kaingang, charrua e mbya-guarani.
A capital gaúcha tem uma condição, de certa forma, privilegiada em se tratando de saúde indígena. A cidade conta com uma equipe de saúde básica que atua, em sistema de revezamento, dentro das aldeias localizadas no município. “Porto Alegre tem esse diferencial porque os indígenas conquistaram essa equipe e isso tem feito a diferença”, explica Rosa Maris Rosado, responsável pela área técnica de saúde indígena da Secretaria Municipal da Saúde (SMS).
Foi essa estrutura de saúde básica que entrou em ação assim que o homem, de 53 anos, testou positivo. Membros da equipe foram na aldeia e testaram 51 pessoas, descobrindo mais 15 indígenas positivos. Todos foram colocados em isolamento na escola da aldeia, preparada para recebê-los, e ainda não apresentam sintomas graves. Nesta quarta-feira (24), 202 indígenas das seis aldeias localizadas na capital serão testados para covid-19.
Desde o primeiro caso confirmado, as lideranças têm mobilizado suas comunidades para reforçar a importância dos cuidados para não propagar o vírus. A característica de famílias extensas e a própria vida em comunidade, torna o ambiente das aldeias indígenas extremamente suscetível à rápida propagação do novo coronavírus.
“Temos muitos indígenas com problemas de saúde crônicos, como diabetes, além dos idosos”, comenta, preocupada, Rosa Rosado. “E os idosos são a verdadeira biblioteca de uma aldeia.” Desde o início da crise do novo coronavírus no Rio Grande do Sul, duas lideranças kaingang já morreram. Segundo Rosado, os kaingang até costumam apresentar boa resistência, verificada em outros surtos epidemiológicos a que já foram expostos. Apesar disso, doenças respiratórias são uma das principais causas de mortalidade entre os indígenas. Se for preciso, a equipe de atenção primária que atende as aldeias da Capital diz que consegue articular a internação junto a rede hospitalar ou exame de alta complexidade.
No Brasil, são 4.185 casos confirmados de covid-19 entre povos indígenas, com registro de 117 óbitos, de acordo com dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena do Ministério da Saúde (Sesai/MS), órgão responsável pela coordenação da Política de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas em todo o país. Porto Alegre integra o Distrito Sanitário Especial Indígena Interior Sul da Sesai/MS.
#FiqueNaAldeia
“É importante haver um alerta para os indígenas, que são um público tão vulnerável. Ficar na aldeia como? Se alimentar como? A questão da segurança alimentar é delicada, os indígenas sobrevivem com a venda do artesanato”, pondera a responsável pela área técnica de saúde indígena da Secretaria Municipal da Saúde (SMS).
Sem poder vender o artesanato que lhes provê o sustento, as comunidades indígenas de Porto Alegre têm se mantido graças a doações de cestas básicas, kits de higiene, e uma parte conseguiu receber o auxílio emergencial do governo federal. O apoio da sociedade civil, destaca Rosa, tem sido fundamental nesse período.
“Agora é preciso o envolvimento de todos para enfrentar esse momento difícil. Não tem sentido um órgão achar que deve aparecer mais que outro. Todos os órgãos e servidores públicos devem cuidar dessas comunidades de forma conjunta e se apoiando mutuamente”, diz Rosa, ciente de que o cuidado à vida dos indígenas, já tão vulneráveis no Brasil, deve prevalecer.
Fonte: Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21